LICITAÇÃO VOLTADA PARA RESULTADOS

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PARTE 3: Incentivar a inovação e o desenvolvimento nacional sustentável

O que torna uma proposta mais vantajosa? Ou melhor, apta a gerar um resultado de contratação mais vantajoso para a Administração?

Certamente os aspectos econômicos da contratação são muito relevantes, uma vez que o Estado tem recursos limitados para a realização de todas as suas atribuições, não é à toa que o principal critério de julgamento das licitações é o menor preço (e agora se tem ainda o maior desconto). Porém, outros valores relevantes afetam a determinação da vantagem, condizente inclusive com a amplitude do que significa interesse público, abarcando o desenvolvimento sustentável, nas suas dimensões ambiental, econômica e social.

Vale mencionar que, dentre os objetivos de desenvolvimento sustentável, contidos no plano de ação denominado de “Agenda 2030”, está assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis (ODS 12), que expressamente estabelece como meta “Promover práticas de compras públicas sustentáveis, de acordo com as políticas públicas e prioridades nacionais”.

Na legislação de licitações é possível se identificar tanto pessoas (microempresas, empresas de pequeno porte, cooperativas e outras formas associativas), quanto áreas (proteção do mercado nacional, do meio ambiente e incentivo à inovação tecnológica), a serem utilizadas como indutoras do desenvolvimento nacional sustentável.

Quanto ao fomento a pessoas, temos a Lei Complementar 123/2006 (art. 42 a 49), por exemplo, que dispõe sobre vantagens para as micro e pequenas empresas, inclusive o microempreendedor individual, quando participam em licitações. O tratamento diferenciado e favorecido envolve prerrogativas nas licitações, com o diferimento no tempo para comprovação da regularidade fiscal e trabalhista e a prioridade de contratação em caso de empate, inclusive de forma presumida, na forma da Lei; bem como as licitações diferenciadas, como, por exemplo, a licitação exclusiva.

Esses benefícios foram ampliados pela Lei 11.488/2007 para as cooperativas, que tenham receita-bruta dentro do limite da EPP, e, posteriormente, pela própria Lei Complementar 123/2006, também para o agricultor familiar e o produtor rural pessoa física.

Quanto as cooperativas, é de se mencionar as discussões travadas no Poder Judiciário a respeito da possibilidade de participação nas licitações públicas, em decorrência de diversas condenações judiciais responsabilizando a Administração em situações de burla aos direitos sociais dos trabalhadores envolvidos pelas cooperativas. Todavia, a legislação passou a constar expressamente a possibilidade de participação no certame e, posteriormente, inclusive a garantir o tratamento diferenciado, tendo em vista que a previsão constitucional, na Ordem Econômica, de incentivo do Poder Público à essa forma de associação, assim como determina o incentivo para as micro e pequenas empresas.

A Lei 14.133/2021 avançou na matéria, disciplinando expressamente a respeito das cautelas a serem observadas na contratação de cooperativas (art. 16), a semelhança do que trata a Lei 12.690/2012 (que dispõe sobre as cooperativas de trabalho), e disciplinando a respeito da fiscalização dos contratos visando a proteção do erário e o respeito aos direitos sociais dos trabalhadores terceirizados em geral.

Quanto ao mercado nacional, vale mencionar a preferência para as empresas brasileiras como um critério de desempate e, inclusive, a possibilidade de serem previstas margens de preferências via decreto federal, tendo sido editado o Decreto nº 11.890, em 22 de janeiro de 2024.

No tocante à preservação do meio ambiente, que já se fez breves considerações em publicação anterior, pode-se mencionar como exemplos de diretrizes de sustentabilidade, entre outras: preferência para materiais, tecnologias e matérias-primas de origem local; maior eficiência na utilização de recursos naturais como água e energia; maior geração de empregos, preferencialmente com mão de obra local; maior vida útil e menor custo de manutenção do bem e da obra; uso de inovações que reduzam a pressão sobre recursos naturais; e origem ambientalmente regular dos recursos naturais utilizados nos bens, serviços e obras.

Vale mencionar a possibilidade de inclusão de critérios de sustentabilidade na especificação técnica do objeto (exemplo, exigência que seja composto por material reciclado, atóxico, biodegradável) ou previsão de práticas de sustentabilidade como obrigação do contratado em prestação de serviços ou obras.

A Lei 14.133/2021 não descuida também do aspecto social do desenvolvimento sustentável, prevendo, por exemplo, a possibilidade de o edital exigir que percentual mínimo de mão de obra responsável pela execução do contrato seja composta por mulheres vítimas de violência doméstica e oriundos ou egressos do sistema prisional (art. 25, §9º), e, como critério de desempate, o desenvolvimento pelo licitante de ações de equidade entre homens e mulheres no ambiente de trabalho (art. 60, inciso III). Esses temas foram objeto do Decreto Federal nº 11.430, de 8 de março de 2023.

No tocante a inovação, que é pilar para o desenvolvimento sustentável, o art. 11, inciso IV, da Lei nº 14.133/2021, expressamente o indica como objetivo do processo licitatório. No texto da Lei, temos variadas hipóteses de contratações diretas relacionadas a pesquisa, transferências de tecnologias, inclusive para a implementação da Lei nº 10.973/2004, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo.

Também conectado com o objetivo de inovação, temos a criação da modalidade de licitação denominada de Diálogo Competitivo (art. 32), que é restrita a contratação de objeto que vise a inovação tecnológica ou técnica, combinada com a impossibilidade de o órgão ou entidade ter sua necessidade satisfeita sem a adaptação de soluções disponíveis no mercado e a impossibilidade de as especificações técnicas serem definidas com precisão suficiente pela Administração.

Nessa mesma linha temos o Procedimento de Manifestação de interesse (art. 81), instrumento auxiliar das licitações e contratações públicas, em que é solicitado à iniciativa privada a propositura e a realização de estudos, investigações, levantamentos e projetos de soluções inovadoras que contribuam para questões de relevância pública.

E ainda a Lei Complementar nº 182, também de 2021, que institui o marco legal das startups e do empreendedorismo inovador, que destina um capítulo à contratação de soluções inovadoras pelo Estado.

Essas e outras normas demostram que as licitações e contratações públicas são instrumentos de execução de políticas públicas, servindo para atendimento das necessidades diretas da Administração e como meio de cumprimento de suas finalidades institucionais, merecendo ser estudadas com profundidade e utilizadas com profissionalismo.

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